terça-feira, 7 de junho de 2011

Carro elétrico poderia acelerar entrada do país no clube dos ricos

Carro elétrico poderia acelerar entrada do país no clube dos ricos
Rogério Lessa, Monitor Mercantil (03 de junho de 2011)


Apesar dos problemas gerados ao meio ambiente e à mobilidade urbana, a indústria automobilística ainda se encontra entre os principais players de difusão tecnológica. Nesse contexto, o carro elétrico é apontado por muitos especialistas como alternativa para manter o potencial inovador desse segmento e minimizar suas mazelas.

E o Brasil poderia se tornar um grande produtor, inclusive para a exportação, principalmente se desenvolvesse uma montadora de capital nacional, não necessariamente estatal.

"O Brasil se tornou um centro fundamental de produção e vendas, mas a aposta no carro elétrico tem de estar associada a outras questões, como a mobilidade nas grandes cidades", ressalva o engenheiro Roberto Marx, coordenador do Laboratório de Estratégias Integradas da Indústria da Mobilidade (MobiLAB).

Ele tem dúvidas se ainda podemos ter uma montadora nacional, "mas talvez seja importante pensar isso no contexto do carro elétrico, pois tem tecnologia diferente e ainda não está definido quem vai liderar o mercado", argumenta, reconhecendo que, provavelmente, sejam as tradicionais montadoras ocupem essa posição.

Custo e benefício
De acordo com estudo do Ministério da Fazenda, elaborado em 2010, o custo de rodagem por quilômetro era de R$ 0,23 no carro movido com motor a combustão, enquanto o carro elétrico tinha custo de R$ 0,06.

Além disso, o motor elétrico não emite carbono e o acréscimo de demanda por energia seria amplamente compensado pela substituição dos motores movidos a combustível fóssil. Ao mesmo tempo, o preço de um carro convencional ainda é um terço daqueles movidos a energia elétrica. No entanto, o maior peso está concentrado nas baterias, cujo desenvolvimento tecnológico fará o custo cair substancialmente.

Marx, que também é coordenador do Curso de Capacitação em Análise e Projeto de Negócios no Novo Setor Automotivo na Fundação Vanzolini, entidade ligada à Universidade de São Paulo (USP), enfatiza que a idéia de uma montadora nacional estaria ligada ao fato de que uma empresa nacional, mesmo que privada, teria seu centro de tomada de decisões localizado no Brasil.

"As transnacionais tendem a decidir de acordo com suas conveniências e as pesquisas acontecem nas matrizes. Não fazem nada no Brasil. Essa é a diferença da empresa de capital nacional. Para fazer com que as montadoras tradicionais invistam nisso aqui não é muito fácil, a não ser através de algum incentivo à legislação. Mas parece que não tem muito movimento do governo ou das empresas nesse sentido", lamenta.

Mobilidade
Sobre o problema da mobilidade nas grandes cidades, Marx pondera que a frota no país deve dobrar em quinze anos: "Em 2025 estaremos produzindo seis milhões de carro por ano, enquanto hoje são 3,3 milhões. Estudos econométricos mostram que ficará inviável. Tem de se repensar o padrão de produto."

Segundo o especialista, isso interessa também às montadoras: "Se acharem que venderão sempre mais do mesmo, o colapso será maior. Elas precisam discutir como governo e admitirem uma empresa nacional, desde que fosse encontrada uma forma de manter lucro sem apostar em volumes cada vez maiores de produção e vendas."

Para o professor da USP, a montadora nacional poderia explorar nichos que as tradicionais ainda não ocupam: "Em Vancouver, no Canadá, só são permitidos táxis com motores híbridos. É uma tendência e o carro elétrico tende a entrar nesse nicho", prevê.

Exportações
Gustavo Santos, doutor em Economia pela UFRJ, lembra que o Brasil poderá se tornar um grande exportador, caso desenvolva o carro elétrico e tenha uma montadora nacional. O economista lembra o papel da indústria automobilística na difusão de novas tecnologias.

"Os setores metal-mecânico, químico e eletroeletrônico respondem por algo entre 55% e 75% das exportações dos países desenvolvidos e Tigres Asiáticos e mais de dois terços das patentes industriais. Essas "indústrias centrais" constituem a base das inovações e da competitividade das nações desenvolvidas, cujos gastos em P&D respondem por 70% dos globais. Quem deseja se tornar desenvolvido, precisa estar presente competitivamente nessa área", resume.

Nos três setores citados, Santos pondera que a indústria metal-mecânica se sobressai às outras, sendo a indústria automotiva o carro-chefe: "O desenvolvimento do sistema Toyota de produção substituiu o fordismo e ajudou a fazer do Japão um país desenvolvido, após ser praticamente destruído na II Guerra. Já a rápida industrialização da Coréia do Sul é resultado, em parte, da engenharia reversa (imitação) no setor automobilístico", exemplifica, lembrando a importância do planejamento e do apoio estatais também no caso da Índia, mais recente.

"A Tata Motors fez alianças estratégicas também com empresas estrangeiras privadas, como a italiana Fiat ou até a brasileira Marcopolo, em 2006. Através de subsidiárias e companhias associadas, a Tata opera na Grã-Bretanha, na Coréia do Sul, na Tailândia e na Espanha", lista, acrescentando que as empresas chinesas, que até recentemente não exportavam, já desenvolvem muitas tecnologias automotivas.

Bateria
Por sua vez, a economista Claudia Martins, professora da Universidade Veiga de Almeida (UVA), lembra que os novos veículos elétricos estão disponíveis no mercado internacional e os avanços recentes com relação às baterias fazem ressurgir essa alternativa como um meio de locomoção urbano.

"A popularização do carro elétrico poderá ser a chave para manter o alto crescimento e para estar preparado para a tendência de motorização elétrica.. O país tem um enorme potencial hidroelétrico a ser explorado, grande volume de gás natural e sol abundante com baixa emissão de carbono a serem aproveitados", salienta.

Cláudia observa que, na história da indústria automobilística, os veículos elétricos mantiveram-se como uma valiosa opção por mais de um século, mesmo perdendo espaço para os automóveis de produção em massa, e com motor a combustão, no início do século XX.

"Hoje o veículo elétrico é imprescindível para a viabilização da economia de baixo carbono, que se baseia em mais eficiência, eletricidade de baixo carbono e mobilidade de baixo carbono. Quanto à mobilidade, o carro elétrico é solução perfeita, pois tem zero de emissão direta e aproveita as fontes alternativas de geração elétrica. Além disso, é também a mais eficiente em termos energéticos, pois se reabastece na frenagem, na descida e não gasta energia em ponto morto", resume Cláudia, doutoranda em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPED/IE/ UFRJ).

Mercado forte
O Brasil produziu 3,6 milhões de unidades em 2010, segundo a Associação Nacional de Veículos Automotores (Anfavea). Em vendas, já está em quarto lugar, com 3,5 milhões de unidades. De acordo com a Anfavea, entre 2003 até 2010, já foram vendidas 12,5 milhões de veículos com motor bicombustível. Ano passado, a participação dos veículos com motor flex fuel atingiu a marca de 86%.

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