Vidas na contramão do mercado de trabalho
Antes da turma de 1980 entrar na Poli, o País vivia o "Brasil Grande". Eles viram o Estado falir e falam da retomada da profissão
iG Economia
Eles viveram o fim do "Brasil Grande", a falência do Estado e o descontrole da inflação. Três décadas depois, os formandos da turma de 1980 da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), uma das mais antigas e tradicionais faculdades do País, veem a profissão de engenheiro civil ser revalorizada. Clique abaixo para conhecer algumas histórias:
A profissão está atraindo novamente as melhores cabeças", diz o politécnico Mário Rocha Neto, um dos integrantes da turma de 1980. Fiel à engenharia civil nos últimos 30 anos, Rocha Neto pode falar com segurança sobre o assunto à frente de uma das superintendências da Gafisa, uma das maiores construtoras do País, na qual ingressou como estagiário em 1978.
Segundo Rocha Neto, a Gafisa absorve 450 estagiários por ano, e seu programa de trainee atrai 12 mil jovens, dos quais 20 ingressam nos programas da construtora. “Hoje, administramos 350 obras em todo o País", diz. "Há cinco anos, eram 30. A engenharia continuará crescendo nas próximas décadas.”
Da Escola Politécnica, criada em 1893, saiu boa parte da elite paulista. Entre eles, os empresários Olavo Setúbal (Banco Itaú), Rubens Ometto (da usina de açúcar e álcool Cosan) e Laércio Cosentino (da empresa de informática Totvs), além de políticos como Mário Covas, Paulo Maluf e José Serra (que não concluiu o curso).
Quando os garotos e garotas da turma de 1980, em sua maioria bons alunos de matemática e física, fizeram a escolha pela engenharia meia década antes, o Brasil vivia o milagre econômico: hidrelétricas eram construídas, pontes erguidas e rodovias rasgavam os confins do Brasil.
Foto: Arquivo
Os amigos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP): Carlos Alexandrino, Artur Pesce, Carlos Jahara, Aurélio Falcon, Caetano Zani e Cláudio Kleine
Ao deixarem a Escola Politécnica, encontraram um Brasil em plena ressaca: viveram momentos de penúria na engenharia. "Foi o ano da crise fiscal. O governo, que era o grande cliente, quebrou", diz Antonio Sérgio Conte, engenheiro civil, que largou o emprego numa construtora nos anos de 1980 para abrir a própria empresa de consultoria em planejamento.
Engenheiros em formação
O cenário, agora, é bem diferente. A demanda por engenheiros está em alta. Neste ano, 50 mil jovens devem sair das faculdades de engenharia, o dobro do que o Brasil formava há dez anos. Segundo estudo do Instituto de Pesquisas Econômica Aplicada (Ipea), quase 1 milhão de novos engenheiros vestirão beca e pegarão o canudo até 2022.
"O engenheiro sai mais bem preparado do que acontecia em nossa geração", diz Carlos Alexandrino, outro politécnico de 1980, dono de uma construtora de porte médio em Campinas, no interior de São Paulo. "Hoje, os computadores fazem boa parte do trabalho de cálculo com mais rapidez e precisão."
Não basta, contudo, apenas o diploma. Os alunos mais destacados da Escola Politécnica também se aperfeiçoaram em outras áreas, com pós-graduação em administração ou cursos de especialização, como formação de lideranças.
Outros buscaram a especialização. Uma das raras mulheres em um ambiente predominantemente masculino (situação que mudou bastante nos últimos 30 anos), Gisela Coelho demorou sete anos para entrar na engenharia e acabou se debruçando sobre a área ambiental. “Ninguém falava em sustentabilidade naquela época. Hoje essa exigência é fundamental.”
Escassez de mão-de-obra?
Apesar da mudança da qualidade e da quantidade de engenheiros formados, há risco de escassez destes profissionais daqui pela frente - um apagão de mão-de-obra que poderá comprometer o crescimento brasileiro, sugerem especialistas.
Comparativamente com outras nações em desenvolvimento, o Brasil forma poucos engenheiros. A Coreia do Sul, com uma população quase três vezes menor do que a brasileira, fornece mais de 80 mil engenheiros por ano no mercado de trabalho.
No estudo "Escassez de engenheiros: realmente um risco?", publicado em fevereiro, o Ipea conclui que o Brasil poderá precisar de 2,4 milhões de engenheiros até 2022 se o PIB crescer 5%.
Se houver uma aceleração forte da economia, a situação se agravará. No cenário mais otimista de crescimento, de 7%, a demanda por engenheiros poderá aumentar para 3,9 milhões, projeta o Ipea.
Hoje, existem 750 mil engenheiros formados no Brasil, mas apenas pouco mais de 200 mil atuam diretamente na área. Meio milhão de engenheiros estão fora de sua carreira - migraram para o setor financeiro, prestaram concurso público ou exercem atividades bem longe da formação original.
"A gente ganhava muito pouco. Muitos foram para o mercado financeiro", diz Carlos Alberto Jahara, outro aluno da Poli, que trabalhou por 15 anos em informática, antes de voltar à engenharia há três anos.
Para atacar o problema e fazer com que eles voltem à profissão, os pesquisadores do Ipea concluíram que a situação exige maior investimento na formação e cargos e salários mais altos aos profissionais do mercado, a ponto de não só reter mas também atrair os que abandonaram a profissão.
"Não é fácil essa readaptação à engenharia", admite Jahara. Ele juntou sua experiência em informática ao aprendizado de engenharia. "Hoje, desenvolvo software para controlar à distância os custos de inúmeras obras de engenharia civis."
ótimo conteúdo!
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