Camargo quer transposição no Mar Morto
Camargo Corrêa quer água do Mediterrâneo no Mar Morto
Sergio Leo, de Jerusalém
Valor Econômico - 15/03/2010
A Camargo Corrêa, que integra a comitiva do presidente Lula a Israel,Palestina e Jordânia, tentará convencer os governos locais a apoiar umprojeto de transposição de águas do Mediterrâneo ao Mar Morto, paragarantir abastecimento de água e energia na região. "O Brasil é o únicopaís e Lula o único presidente capaz de andar bem nos três países",disse Fernando Botelho, um dos principais acionistas da Camargo, autorda proposta. O projeto, de até US$ 5 bilhões, incluiria umahidrelétrica, aproveitando o desnível entre os dois mares.
Quase tão ambiciosos quanto a intenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de influir no processo de paz entre israelenses e palestinos, são os planos que a Camargo Corrêa leva na comitiva presidencial, que começou ontem em uma visita a Israel, territórios palestinos e Jordânia. A construtora brasileira já mantém contatos com as autoridades locais e quer convencer os governos a apoiarem um projeto de transposição de águas do Mediterrâneo ao Mar Morto, para garantir abastecimento de água e energia na região.
"Temos tecnologia própria para grandes barragens; o Brasil é o único país e Lula o único presidente capaz de andar muito bem pelos três países", argumenta Fernando Botelho, um dos principais acionistas da Camargo Corrêa, autor da proposta. "Temos a única proposta de empreendimento totalmente privado, que reverte aos governos no fim do contrato", defende. O projeto, de US$ 3 bilhões a US$ 5 bilhões, incluiria uma hidrelétrica aproveitando o desnível entre os dois mares, e teria, ainda, uma planta de dessalinização, de custo ainda não calculado, capaz de prover água até para as regiões desérticas que compõem mais de 60% do território israelense.
A Camargo é uma das quase 70 empresas brasileiras que enviaram representantes a Israel e Jordânia, para seminários sobre comércio e investimentos na região. O forte interesse das empresas israelenses em participar dos investimentos em segurança no Brasil para a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016 ajudaram a inflar a participação de empresários do país, que chegará a 200, no seminário. Obras também na Jordânia atraíram representantes das grandes empreiteiras brasileiras.
Desde a década de 70 discutem-se projetos de transposição de águas para enfrentar a progressiva diminuição do Mar Morto, que vem secando e reduz suas margens à alarmante taxa de um metro por ano. O mais recente desses planos, que tem a preferência dos governos da região por localizar as obras nas fronteiras de Israel e Jordânia, é alvo de um estudo de viabilidade do Banco Mundial que deve ser concluído em 12 meses e prevê a transposição de águas do mar Vermelho para o Mar Morto. A Jordânia prefere transferir a água do mar Vermelho para manter todo o projeto em território onde detém soberania.
Botelho convenceu Lula a incluir o projeto na pauta de conversas com autoridades israelenses, palestinas e jordanianas. Ele argumenta que a questão da soberania estará resolvida com a criação de uma empresa internacional com participação de todos os interessados, no modelo adotado por Itaipu. O financiamento independerá dos governos porque o projeto será auto-sustentável, acrescenta. "Estamos falando de uma empresa, cotada em bolsa", diz.
"A maior garantia de soberania é a regularização do abastecimento de água", comenta o empresário. O projeto prevê um túnel de 70 quilômetros do litoral ao mar Morto, 800 metros abaixo da terra sob Israel, dentro do qual seria instalada a hidrelétrica, com capacidade de geração de 1,5 mil MW na ponta e mais de 500 MW de energia firme, atendendo a uma região - especialmente a Jordânia - carente de energia e água. A Camargo tem experiência em usinas do gênero, como Corumbá e Porce III, lembra o empresário.
Antes de elaborar o projeto, já aprovado pelo conselho de administração da Camargo Corrêa, Botelho sobrevoou a região, em um helicóptero. Um dos pontos de seu roteiro foi o lago Kineret, o maior de Israel, antigo Mar da Galileia, administrado em conjunto por Israel e Jordânia, apontado por Botelho como demonstração de que é possível acordo entre os dois países nessa questão delicada. "Mesmo nas piores secas, Israel manteve os compromissos com a Jordânia". Na última visita do presidente de Israel, Shimon Peres, ao Brasil, no ano passado, o tema foi levantado nos encontros com Lula. Botelho chegou a mostrar o projeto ao enviado especial dos EUA ao Oriente Médio, George Mitchell, ao encontrá-lo em Jerusalém, há cerca de duas semanas.
O empenho do executivo esbarra em forte ceticismo devido a resistências nos governos de Israel e Jordânia, mais interessados na transposição das águas do mar Vermelho - projeto caro e mais complexo, diz Botelho. "Sei que é difícil, um desafio diplomático; mas o Brasil não tem interesses na região, isso ajuda". Dificilmente qualquer decisão será tomada antes de se conhecer o estudo de viabilidade do Banco Mundial para o projeto do mar Vermelho, mas Botelho não se incomoda. "Belo Monte levou 30 anos".
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